domingo, junho 29, 2008

difusa como as profundezas do mar.

eu quero aprender a língua do vento.
escuta, e se eu te cantasse,
e se eu te levasse?
não sabes cantar.
pois sei.
pois não.
não
sabes.
e elas cantaram as músicas dos passarinhos,
longe longe do vento.
eu passava os dedos pelos seus cabelos
e me perdia em labirintos inventados.
e então voava pra fugir disso tudo,
encantada,
que nem o outro moço lá,
pra ficar tanto perto do sol quanto do mar.
eis que encantadoras vidas me levaram as asas,
náufrago merecido.
eis-me num mito perfeito,
do herói naufrágio.
com todos os dedos da mão
e do pé,
e um a menos coração.

sábado, junho 28, 2008

esquizofrenia não

ah, como eu espero....
todos os dias,
estar perto de você pra me sentir mais sincera.

quinta-feira, junho 26, 2008

acordar

acordou.
o mundo inteiro e o seu corpo,
um bando de sensações difusas.
começou aos poucos:
percebia, talvez tarde demais, ou cedo,
que o mundo era um
e ele era outro.
sentia os pés,
tão longe....
envoltos no segredo cruel do frio.
e as mãos metidas dentro das calças,
a procura de algum calor miserável.
então o mundo talvez se repartia entre coisas,
a mulher ao lado acabava no limite de sua pele,
(imaginava),
a luz já era tarefa mais difícil,
assim como a chuva,
embora uma vez ele tivesse escutado que a umidade das mulheres
se assemelha a chuva.
olhou para o espelho do banheiro
entrevisto pela porta aberta,
sorrateiramente,
e aquilo o localizara novamente,
num tempo e espaço bem preciso,
(espantava os sonhos como cachorros vadios).
ele sentia fome e dor na coxa esquerda,
existia,
existia,
tudo não parava de lhe dizer.
e no entanto,
assim também lhe eram os sonhos,
que tinham algo da morte.
e algo o afastava
(ligeiramente)
daquilo tudo.
algo como um protótipo magnético
que ocupasse o seu lugar,
e que na hora de voltar,
ele ficara como está:
flutuando em órbitas inseguras,
em volta do próprio umbigo.

saudades de mim

rita, devolve o meu sossego, cansei de ser a única luz acesa da cidade, quando já é alta madrugada. rita mãe, se lembra de levar o lixo pra fora, amanhã me acorde com ternurna, que eu já não estou acostumada. dê um beijo nas minhas costas, e quando eu blasfemar e gritar e chorar, saiba que ainda não é hora de ir embora, é só meu desespero que a manhã trás. a vida meu amor, é esse eterno emudecer, percebe que é feita de dias, dias e dias? todas as horas contadas de uma vida.
escuta, me abraça forte mais uma vez, que eu não aguento mais saber o que é viver. porque todos os corpos são iguais, e todos nós temos nariz, e nariz é uma coisa pra lá de esquisita. somos todos tão esquisitos. e às vezes eu realmente penso que lido com pessoas de aço, ou que se não, ao contrário, são como pequenas nuvens tenazes, me acertando com sua umidade. esses são os piores. esses só sopro. porque nem revidar eu posso. tento lhes acertar um soco, e as nuvens desenham novos desenhos.
rita, me trás mais uma dose, ou quem sabe vamos jogar um jogo. você me conta uma história, eu te conto outra, a gente se reveza nisso de se olhar, e vai tecendo uma história fabulosa que só termina quando acabar.
querida, me dá suas mãos, vamos combinar de ser macias, eu só quero me distrair, a gente se abraça de um jeito novo, e daí não vai ser se abraçar.
minha flor, eu não me reconheço, estou cansada dessa pessoa aqui jogando minhas palavras fora, vem pra perto de mim, você que também taopouco existe, suga minhas entranhas quando for a hora. e não se esquece, meu amor, de depois levar o lixo lá fora.

medo

a umidade da pedra agarrava-se aos seus lábios,
florestas inteiras dentro dela,
escurecendo.
sons sem donos,
difusos,
seus dêmonios, o mundo dentro e fora dela,
a mesma massa orgânica.
em algum ponto ela pediu perdão.
abaixou-se de joelhos rente à água,
e fechou os olhos.
há tempos não ouvia as palavras,
mas fez com as mãos uma concha,
e preenchendo-as de matéria sua,
as levantou em libação,
fazendo ranger as rodas do tempo.

quarta-feira, junho 25, 2008

pineu

ela acordava todos os dias às 5 e 40.
achava justo ver o sol,
já que todos os dias ele voltava a nascer.
ela acordava e vestia sua pele que deixara secando na noite passada,
punha os olhos cuidadosamente,
os cabelos,
os dentes,
tudo menos os buracos,
uma vez que durmira com eles.
então ela lembrava do mundo,
(e isso era o sol quem o fazia),
e ela lembrava de vestir as saudades,
com cuidado para as alegrias e as lágrimas não se misturarem,
vestia os ódios, cuidadosamente separados das ideologias,
punha o ócio e a vaidade,
a gula, o êxtase absoluto, e também aquela velha sensação cheia de mofo,
o nada.
o mundo continuava então a nascer,
os orvalhos invariavelmente evaporavam,
os passos continuavam,
e os sons eram pressentidos.
para ela, isso pouco importava,
fazia tanto tempo que tudo isso acontecia,
que já nem era mais tempo,
era retorno,
em espiral o infinito.
entretanto, um dia, desatenta,
ela vislumbrara o tempo,
pois ao vestir sua desusada sensação de nada
notara que o mofo quase a havia destruido por completo.
e, apesar dela nunca lançar mão de tal sensação,
isso a preucupara, e a aflingira.
e assim foi, pelos próximos meses,
logo antes do sol nascer, ela aproximava-se do nada,
e lá estava, um pouco mais daquela rara penugem
meio esverdeada.
então um dia,
não se sabe exatamente se se passaram anos, meses, ou vidas,
a sensação de nada desaparecera,
não transformara-se em pó,
mas transformara-se em nada.
e ela, que vivia bem ali,
pois acreditava na imersão do tempo,
de que tudo era o mesmo ontem,
e de que de tanto tudo, ela não precisaria de mais nada,
caiu por terra de joelhos.
sentiu então gotas de saudades descerem-lhe pelo pescoço
(e também lembrou de recolhe-lhas, para as vestir no dia seguinte),
lembrou através da memória,
e sentiu raiva e vaidade,
por ter o seu nada perdido,
e riu de êxtase absoluto,
pois perdida em desespero.
e quando desvestida,
em pleno dia,
de todos os seus caprichos, peles, e meios dias,
inflou-se de uma antiga sensação,
que se chamava vazio real que é viver,
e então ela a apelidou de nada,
esqueceu-se,
e viva, adormeceu,
infinitamente.

terça-feira, junho 24, 2008

a noite

escuto o teu nome na noite,
como o frio que de repente toma meus braços,
e de repente se torna incerteza.
escuto seu nome em vão,
tento te alcançar com meus braços,
chamo seu nome,
te chamo querida,
nunca, jamais, te alcanço.
a noite é infinita,
a escuridão da noite,
o silêncio da noite.
escuto seu nome,
e percebo que ele vem de mim.
não me escutarás,
não verás o meu calor chegar,
a noite é imensa
a noite é vulgar.

que raios

quando ela vier que eu esteja encantada,
que ela feche meus olhos com um sopro
que eu possa não pensar em nada.
quando ela vier
que venha de preto.
quando ela vier
que só eu a veja,
e que ela toque minhas mãos.
que ela me leve,
quando tudo for só trevas.
que pela minha boca saia minha alma,
para que igual a ela eu me torne.
negra, a morte.

segunda-feira, junho 23, 2008

ritmo

Eu
Ando
Nu

E o vento que me leve.

Tenho
Sim
Pois Não

Diabo que carregue.

De
Um
Fio Terra

Sequer uma vontade.

Sou
Muito
Pura

E cheia de idéias.

domingo, junho 22, 2008

oração

cortar os cabelos como quem decora nomes
insistir nos mesmos erros
se lembrar de se esquecer
perder o prumo - e as passagens
roubar o frio de uma flor
desfazer-se dos deuses
coisas dessa quarta-feira
amar entre os pés de laranjeira
atear fogo na terra
apresentar o vento à mágoa
desconhecer.

algueres mulheres

ser
ter e temer
tremer
de prazer
esperar
algo da vida
algo belo
algo em cheio
algum incenso
sem senso um cheiro
eu e você
momento acesso.

um segredo

suspenso no ar
- aquele momento.

como se escuro,
as mãos tatiando o caminho,
para desaprender as carícias que nos farão tanta falta.

os olhos mais bonitos que sempre,
já guardam outras imagens,
sonhos de outros sonhos.

meios sorrisos
verdades inteiras

palavras erradas
apostas fechadas

as coisas bonitas
explodiam na sua boca
(bolhas de sabão)
e me dava vontade de chorar.

um pedaço de presente
com os braços agarrando o passado.

um último olhar antes de continuar andando,
como quem sabe guardar um segredo.

quinta-feira, junho 19, 2008

as armas e os barões assinalados

ouvir como conchas do mar,
andar com soluços secos,
se ver e não se olhar.

a sala está vazia.
a cidade convulsiona pela janela aberta.
o corpo que lê o jornal,
não fede nem cheira,
vira as páginas mecanicamente,
e tem o mundo nas mãos,
(embora não tenha conhecido, ainda, os vizinhos).

enquanto isso
seu coração descontrolado,
dúbio, ébrio,
canta vidas outras,
dentro de suas esquinas,
um sim, ou não - talvez.

num dos quartos de sua alma um leão,
com as jubas vastas, os olhos calmos,
com a sapiedade de vidas passadas.
o leão espera afoitamente que o mágico,
que mora no quarto ao lado,
traga-lhe a carne moída do almoço.
(na falta de fêmeas, mágicos).

num andar acima mora a cantora de jazz,
e sua coleção de vestidos.
toda noite ela canta para uma platéia vazia
(todos preferem o show de horrores do quarto andar),
embora escute em seu peito a explosão da salva de palmas.

há muitos quartos,
há muitas pessoas.
gordos, carecas, sereias,
e até um anão,
apaixonado pelo frigobar.

mas entre tantos quartos e gêneros,
há uma porta que a menina dos olhos puxados não ousa abrir.
o quarto tem seu próprio pulso,
suas próprias idéias,
suas próprias paixões.
nele o vinho vira água,
os filhos mais velhos,
das moscas e das rãs,
morrem com feridas na pele.
há frio e escuridão,
e a vontade determinada de que um dia
(talvez tarde, talvez nunca)
as portas se abram,
e numa linha contínua e infinita,
saiam todos
resíduos emprestados de uma vida,
cigarras e gafanhotos.

segunda-feira, junho 09, 2008

semente

respira, pulsa, entre as mãos
pequena matéria,
cria latente.

para a arvore, uma semente.
no tempo presente,
paciente o futuro.

cindir

uma voz chama meu nome.

antes calma, bem distante.

uma voz chama meu nome.
vira um fiabo de luz
se despedaça.

há carne
e nao há mais nada.

sexta-feira, junho 06, 2008

opaco reflexo

opaco reflexo,
que me adianta a vida.
a noite agarro-me ao escuro,
de tarde a ausência me arde,
me encontro apenas no banho.

opaco reflexo,
grita minha perda,
dos fazeres sem vontade,
atos tolos sem presente.