quinta-feira, dezembro 24, 2009

natal

faz tempo que não escrevo poesias,
por isso vez ou outra no mês me obrigo a dar uns minutos pra esse espaço.
não tem adiantado,
faço umas piadas cretinas,
me entristeço.

não é um problema de tradução,
acho que as próprias imagens enfraqueceram.
as duas mortes que existem são essencialmente iguais.
tenho medo mais da primeira que da segunda.
tenho medo de morar num bairro pop,
ler revista bravo,
e ser feliz com o meu destino.
tenho medo de ter amigos porque a calça deles é bonita.

tenho um medo de acordar um dia assim,
e me calar
num silêncio não de estar,
mas de poucas palavras.

segunda-feira, dezembro 21, 2009

mapa mundi

quando veêm um contraditório
logo dizem:
nele não confio,
o azul que amanhã amarelo.
já eu não meço o confiar no estar por igual
e idêntico no sempre.
vantagem penso,
os relevos disformes e complexos
do eu que mente.

domingo, dezembro 13, 2009

oi

Eu não queria chegar em casa tão cedo. Estava com um gosto de amarelo na boca, de madeira antes de queimar. Não queria ter de ouvir os outros, fingir energia para concordar com suas besteiras. Ser natural ali cansava muito.
Então a primeira premissa: ser antinatural.
Cheguei em casa com um sorriso campeão no rosto,
quem me visse poderia vir a pensar que eu era a filha preferida de alguém, que era vice campeã brasileira de natação, e que estudava direito com mérito e prata.
Apliquei abundantemente a generosidade e a simpatia no terreno familiar, friccionando com os nós dos dedos para a matéria entrar mais profundamente.
Eles relaxaram e riram,
olharam para o meu rosto orgulhosos
e pediram pra eu passar o arroz.
Eu passei o arroz
e descansei numa poltrona vermelha despedaçada,
olhando atráves das retinas o filme de um família hipócrita.
Eles discorriam sobre diversos assuntos,
e a desconhecida da natação versava com eles:
arquitetura, viagens, temperaturas, ciência natural.
Ela ali atuava nos terrenos perigosos da maldade,
rimando o mau com o louco.
Eu via t.v. apenas.
Eu, uma sala infinita de pretura, a poltrona, uma mesinha com um peixe chamado Jacques, e um tapete que eu peguei emprestado com a minha vó.
Depois subi as escadas e me encontrei.
A água encheu o aquário e Jacques morreu afogado.
Ele era um peixe das idéias e não suportava água.

saci

a muralha se estirava preguiçosamente sobre a cidade.
seus pés cansados cinzas
seu corpo areia endurecida pela água da praia.
via a cidade crescer contida em seus muros,
o movimento fazia cocegas em sua barriga gorda.

se você andasse equilibrado em um só pé por toda sua extensão
ela lhe daria a mão no final
e o conduziria para sua casa.

ela lhe mostraria biscoitos de chocolate que nunca ficam bons,
e biscoitos de polvilho acertados.
lhe daria chá,
lhe mostraria seu cheiro.

as montanhas como primavera vista da janela
a luz alaranjada da alegria.
se você andasse equilibrado em um só pé por toda sua extensão.

quinta-feira, dezembro 03, 2009

hoje

eu estou na ilha informática do senac.
aqui está cheio de gente terminando os trabalhos de último hora.
eles não ligam para quase nada disso.
talvez eu também não.
a gente tá aqui por pouca vontade,
porque as escolhas são escorredias.

eu queria viver de escrita e morar num lugar tranquilo,
bem bem longe de são paulo.
mas eu moro aqui e todos os dias não entendo porque não sei ser feliz.
alguns deles também.
por isso a gente vive procurando catarse,
purgação, polução.
a gente trepa para aliviar o corpo,
bebe pra aliviar a mente,
e vê t.v. pra aliviar a alma.

aí a gente acorda,
mesmo sendo tão improvável,
e sai de casa a procura do encontro.

mas como,
se a gente não tem calma,
se a gente não tem corpo,
alma, mente, presente.

a gente pega o passado e se masturba nele,
ou então chora e ri por um futuro ontologicamente impossível.

a gente vai deixando as coisas virarem florestas na cabeça,
por excesso de criatividade
e pouca paciência.
também não conseguimos mais esperar nada,
isso não.
as florestas mentais vão crescendo,
comem de tudo,
lixo, música.
são lindas elas,
nos distraem,
e vão dando voltas na cabeça até tapar os olhos.

aí você leva um chute na cara e acorda,
no presente.

assim não

claramente assim não.
esse garfo enfiado no peito,
como se o asfalto quente ou frio,
tivesse chegado a mil graus e então tivesse sido prensado.
como se nesse asfalto um sapo atropelado tivesse sido incrustrado.
como se o coração cansado de pulsar no asfalto,
morto, atropelado,
tivesse sido incrustrado.