ali eu te olhava de dentro. o mundo aquário me guardando da ferocidade do ar. era muito difícil viver. muito difícil sair desse cheiro de carne rubra que existe no lado de dentro das coisas. no entanto eu te via. e tremi quando vi suas coxas. elas se mexiam com delicadeza. a loucura zunindo no meu ouvido. todo esse lado de dentro chovia. os minutos escorriam pelo quarto, esguios, espertos. sua mão contornou minha dor. chegou no cerne. nos olhamos bruto, embora tudo parecesse tão pouco real.
fui embora e o sangue escorreu por esse caminho criado por nós. sua mão ainda estava lá. disse adeus atenta. o vazio agora é carne limpa, latente. pronta para ser carne novamente.
quarta-feira, agosto 29, 2012
sexta-feira, agosto 24, 2012
liberdade
prensado entre o ar espessado do meio dia e os cheiros fortes dos outros que sou obrigado a sentir.
a solidão grita delícias. os onibus passam e é bom não ir para lugar algum. é bom ser aquele que olha. que deixa que tudo passe diante dos olhos. há algo de subversivo e necessário para a ordem de todas as coisas.
a solidão grita delícias. os onibus passam e é bom não ir para lugar algum. é bom ser aquele que olha. que deixa que tudo passe diante dos olhos. há algo de subversivo e necessário para a ordem de todas as coisas.
quinta-feira, agosto 23, 2012
como quem salta no ar como água
corre melhor ir para onde saberá o dia escancarado sobre meus dedos que percorrem as vértebras indecisas da praia estirada, da vida discreta e no entanto, tão explicita no seu silêncio. fuma por que o ar denso inspira. bebe por que baco põe a mão pesada na cabeça em prece. vive por que ele canta e tudo continua dançando. continua embriagada desse silêncio que eu vou junto.
terça-feira, agosto 21, 2012
lago
Depois do jantar, com o beiços engordurados,
abriu o envelope. As fotos caíram escancaradas. Nada ali era óbvio. O recorte do ombro revelava antigos desenhos. A lembrança de uma nuvem que passou rápido
demais. Uma pinta no nariz desdobrava todo um mapa complexo do seu corpo,
constelações infinitas, estrelas sem brilho, estrelas sem nome. Nada ali era
óbvio. Ali não havia o que da mulher sucita sua besta fera. Ali a maldade era
maior. A beleza discreta e sincera do seu cabelo caindo a direita mexia nos
torrilhões do dentro de dentro. A beleza dela movia sua escuridão mais bem
guardada.
Toda mulher antes de morrer deve ter sido muito boa e muito
má. É importante que tenha cruzado esses caminhos. Todo homem antes de morrer
tem que homenagear precisamente uma dessas mulheres.
O plano se traçou rapidamente em sua cabeça. Riu
pateticamente do piano encostado num canto escuro. Riu da sua ingenuidade, riu
da falta de fibra, da falta de horror que havia naquele instrumento. O som do
piano era muito claro. Imaginou cartas, textos, meramente desenhou frases. Elas
pareciam poucas. As palavras se tornaram opacas.
Ele então passou as mãos nas coxas. Dos joelhos em direção
a barriga. Lentamente. Uma, duas. Três vezes. Ouviu o som do tecido sibilando.
Sentiu o calor aflito do atrito na palma. Trocou o teso das pernas, pelo duro
dos dedos.
Pegou a chave num átimo e partiu.
No número 349 ela já esperava por ele. Esperava vestida,
guardando segredos. Esperava sutil, mansa. Esperava com suas pintas e os mil
nomes ainda a ser dados, conquistados, devorados. Esperava como uma mulher boa,
como uma mulher má, como uma mulher antes de morrer pode e deve esperar alguém.
Ele olhou profundamente para ela. Ele lançou seu olhar
escuridão obscena do desejo, febre. Ele lançou seu olhar calor fluido do amor,
temperatura. Ela recebeu tudo aquilo inteira. Soube se deixar abater sem cair.
Ele começou a beijar ela ali mesmo. Não havia mais nada a ser feito. Essa seria
sua última homenagem. Ele beijou com calma, porém voracidade. Pegou seu corpo
com todas as palmas de todas as mãos, sem
machucar. Ele conheceu a luminosidade estranha do plexo, o labirinto das
costelas. Conheceu a calma furiosa dos cabelos. A delicadeza despudorada dos
lóbulos. Se embrenhou nos dedos da mão. Fez da curva da coxa com a bunda uma
esfinge. Trocou olhares com os joelhos. Percorreu a língua pela coluna, praia
imensa, mar infinito. Sentiu seus dedos, seu corpo, seu eu, agora já sem nome,
batendo água na areia, ritmo, chamando, chamando. Sentiu ela respondendo,
terra, pulsar denso. Imagens vinham de todos os lugares da casa secundar os
gritos, a lua gemia baixinho, o ar pesava suores.
Em algum momento tudo aquilo passou. A mulher viu o homem.
Tocou seus ombros fortes que logo antes a amparavam. Olhou seu órgão melancolicamente
alegre. O seu suor na nuca. Ela olhou para aquele homem que pela primeira vez a
transportara para esse antilugar em que estão ou estarão ou já estiveram,
alguma vez, todas as mulheres do mundo. Ela olhou para ele e viu um menino. Ele
já dormia. Imbuido de algum tipo de paz. Ela deu um beijo no seu entreolhos e
fechou os seus próprios. Enquanto dormia sonhou que era um lago. O menino e o homem inauguravam nela o milagre de ser um lago. A sabedoria de ser um lago. O silêncio de ser um lago.
quinta-feira, agosto 16, 2012
menti pra você
Quantas bobagens tentei te dizer entre o soluço ébrio e a
hora do sono. Quantas palavras errantes te acertaram mesmo assim, em silêncio?
Nos vapores do sonho tenta segurar minhas costelas, não há apoio, não há
maçaneta que abra essa porta do peito. E no entanto você abre. E no entanto
você se esconde. Entre as jabuticabeiras da minha infância raiando um dia
infinito. Seu vestido verde e suas coxas cor de mar. Minto verdades para te
agradar. Você sorri. Acho que não fala português. Tem medo, tanto medo. Não.
Agora você só tem alegria. A libidinosa alegria das crianças, levanta os
vestidos, prepara os corpos sempre para as surpresas do cheiro e do sal. Foges.
Por que foges ratinha? (Quem é que incutiu essa imensa ternura em ratinha? foi
Cortázar). O dia tarda. O café da espera. Te espero. Fiz um relógio desse ócio:
A cada novo café, a xícara marca um círculo de borra na mesa. Agora São cinco.
Cinco olhos negros que me olham. Que me esperam te esperar. Você chegará sem
previsão. 7 olhos negros. Ou 19. O café me acende e me escurece enquanto você.
Rindo. Que riso tenebroso. Ecoa nos porões da minha mente.
quinta-feira, agosto 02, 2012
bali hai
se lembra quando a gente vinha na minha casa fumar bali hai e ouvir led zeppelin?
a gente ficava tonto na luz baixa. eu não me lembro como você ia embora. eu não lembro aonde era minha cama. eu só lembro da luz. da janela aberta. de nós dois tontos. vivendo numa velocidade altíssima, e lenta. vagarosos momentos.
a gente ficava tonto na luz baixa. eu não me lembro como você ia embora. eu não lembro aonde era minha cama. eu só lembro da luz. da janela aberta. de nós dois tontos. vivendo numa velocidade altíssima, e lenta. vagarosos momentos.
Assinar:
Postagens (Atom)