quinta-feira, fevereiro 28, 2008

pusilame

o dia passa por cima da minha cabeça:
não há escolha.
entretanto ela pulsa,
e continua pulsando.
instantes outros:
quando penso lembro e sou
e a rua com seus rostos anônimos e sóbrios.
quando decido para que lado vou,
e me perco faço e acho.
ligeiro prazer do vento,
sorriso de dentes claros,
para quando tudo está no seu tempo.

segunda-feira, fevereiro 25, 2008

espelho

passa a fome
passam as paisagens pela janela do carro
passam os conflitos os medos os pelos
passa a angústia do não ter
os inimigos
e até os amigos.
passa a vontade de beber.
só não passa você
de frente de um espelho
duelando consigo mesmo.

domingo, fevereiro 24, 2008

the big swallow

quando lhe toco a pele espero letras acordes poemas,
músicas inteiras,
com suas melodias.
és mulher
também as páginas em branco
que deixei em casa
e o violão que tanto te maltrata.
e quando perguntas se vamos bem as duas,
é que para todo o povo da rua,
e abre bem os olhos para nos ver passar,
pois dos poemas que li,
e das músicas que escutei,
és certamente a mais bem feita dessa matéria outra,
dos feitios da poesia
das promessas da ternura.

the big swallow

quando lhe toco a pele espero letras acordes poemas,
músicas inteiras,
com suas melodias.
és mulher
também as páginas em branco
que deixei em casa
e o violão que tanto te maltrata.
e é por isso que quando me perco por suas veredas,
reconhecendo,
uma por uma,
as suas ternuras,
para todo o povo da rua,
e abre os olhos para nos ver passar.

segunda-feira, fevereiro 11, 2008

fato I

começava a sentir dor aos poucos.
sempre aos poucos.
mamãe punha sua mão no ventre que se mexia convulsivamente. e a outra secava o suor que grudava os cabelos na testa.
o tempo se dividia nos compassos da dor,
e a sala pela proximidade das paredes.
era melhor viver assim,
com o problema já dado,
pois então não seria necessário gastar a rala criatividade com outro.
a sede era infinita, e já perdera a muito a característica primeira de tal quimera
(o vulto do saciar).

quinta-feira, fevereiro 07, 2008

américa metáfora fácil

Perdoe-me deus, pois eu peco.
Faço-me prenda fácil de quem consola o âmago.
E de quem, com uma vista bonita,
engorda os bolsos (e o rebanho).
Cedo, todos os dias, à brancura fácil de falsas paredes,
e à presença morna da trilha sonora,
apenas pra poder, segurar o mundo lá fora.

domingo, fevereiro 03, 2008

gêmeos

quando eu a toco não estremeço por dentro, só por fora.
não anoiteço da vontade, e não me perco de desejo.
o meu toque, com ou sem consentimento,
é leve como os passos de quem dança e sabe,
pois de a ver não arrefeço.
beijos de boca fechada,
olhares fixos no nada,
carinhos de solidão.

a frieza de quem menos esperava,
e um eu que desconheço.

esquizo

eu, sempre enganado, pensava estar colecionando mentiras que decorariam o relicário do nosso sexo. pensava estar cortando uma por uma as predileções rituais do nosso sexo. a verdade é que independente da ordem dos fatores ou das palavras, eu pensava em sexo. porque, afinal, nessa época eu ainda pensava nisso.
Então eu ouvia um pouco mais de seus discos, e reincindia na constância suicida do alcool. o fim último da bebida para fortalecer as mentiras, expelir as verdades que inflamariam o ar de sua sala, repleta do nosso bafo roto de más vivências.
Bebemos, e fumamos. fizemos brindes, e principalmente mentimos. ela, quando inventava suas histórias. eu, quando fingia acreditar.
porque éramos novamente adão e eva, e éramos também criatura e criador, homem e mulher; Acima de tudo, éramos reús reincidentes, e por isso, é que deveríamos nos compulgir.
os discos continuavam a rodar na vitrola, como nossas cabeças em palmas de prata, como a sala, muito embora, continuasse parada.
duas músicas depois de seus primeiros passos bêbados, constrangido a acompanhar sua dança, a agarrei pelos cabelos, e como nos primeiros tempos, a levei para o quarto. - como no tempo em que as mulheres compreendiam seus pápeis, e a proximidade da vida com a vida de fato tornava tudo muito justo.
meus dedos duros tocavam seus mamilos excitados. meus dentes afiados os procuravam. eu a amava com meu ódio de ser fraco demais para nosso amor, e ela me odiando me amava, com seus mamilos duros e sua boca seca. ela era vítima da violência de desejar um homem misógino, e por sua vez retribuia-me evitando friamente o seu próprio desejo.
juntos, regurgitavamos a solidão à dois incrustrada em nossos despojos. nossos corpos nus emergindo na violenta febre da morte. nos odiando sem nos amar, do mesmo amor sem ódio que é o um ser dois que nunca se falam.
enfim, antes derrubados pela exaustão física da impossibilidade, do que pela desistencia em si, nos engalfinhamos como dois mafagotos. E dormimos enfim, o sono pesado dos justos.

esquizofrenia

"não é possível que essa cidade que se diz metrópole não tenha sequer cigarros...!". não. não era possível. simplesmente porque nada seria possível a tal altura do campeonato, nem o acidente de carro que poderia parecer provável a alguém de fora, nem a relação dos seus cigarros com a organização geopolítica das cidades. porque, afinal, não poderia ser qualquer cigarro, deveria ser o seu, só ele nos serviria (apesar da hora adiantada e da chuva). atravessaríamos desertos por um minister.
eu, com o sorriso calmo fingindo uma segurança inexistente, a seguia por todos os cantos, com a paciência grave de quem morre de fome. eu a desejava de uma fome inventada desde que pussera os pés pela primeira vez na soleira de sua porta. os vincos marcados do rosto, as histórias guardadas na memória ou perdidas no esquecimento de uma vida não mais jovem, e principalmente o alto teor de mentira que impria em tudo. e em todos.
a desejava com minha fome jovem e folgazã, como quem sabe a única chance repousada no acidente.
compramos seu cigarro. que nos custou 6 visitas rudes a botecos tétricos, uma leve batida no parachoques, alguma gasolina, e muitas mentiras. eu, sempre enganado, pensava estar colecionando mentiras que decorariam o relicário do nosso sexo. pensava estar cortando uma por uma as predileções rituais do nosso sexo. a verdade é que independente da ordem dos fatores ou das palavras, eu pensava em sexo. porque, afinal, nessa época eu ainda pensava nisso.
próximo item: ouvir um pouco mais de seus discos, reincidir na constância suicida do alcool, fortalecer a mentira, inflando o ar de sua sala com nosso bafo roto de más vivências.
pois bebemo-nos, e fumamos. fizemos tantos brindes, e principalmente mentimos. ela, quando eu inventava suas histórias. eu, quando fingia acreditar.
éramos novamente adão e eva, éramos também criatura e criador, homem e mulher; acima de tudo, éramos reús reincidentes, e por isso, soube depois, é que deveríamos pagar.
foi duas músicas depois de seus primeiros passos bêbados, que constrangido a acompanhar a dança a agarrei pelos cabelos, e como nos primeiros tempos, a levei para o quarto. como no tempo em que as mulheres compreendiam seus pápeis, e a proximidade da vida com a vida de fato tornava tudo muito justo.
meus dedos duros tocavam seus mamilos excitados. meus dentes afiados os procuravam. eu a amava com meu ódio de ser fraco demais para nosso amor, e ela me odiava me amando, com seus mamilos duros e sua boca seca. ela era vítima da violência de desejar um homem misógino, e por sua vez retribuia-me evitando friamente o seu próprio desejo.
juntos, regurgitavamos a solidão a dois incrustrada em nossos despojos. nossos corpos nus emergindo na violenta febre da morte. nos odiando sem nos amar, do mesmo amor sem ódio que é ser dois que nunca se falam.
enfim, antes derrubados pela exaustão física da impossibilidade, do que pela desistencia em si, engalfinharam-se como mafagotos e dormiram o sono dos justos.

sexta-feira, fevereiro 01, 2008

o mundo

como o gosto acre do corpo, a poeira seca da terra, rasteira sensação que segue o couro das cobras. abro teus olhos com meus dedos e te anoiteço por inteiro. o lado de fora chove, e o lado de dentro treme. já não há meios, sequer medos. da mesma matéria-mentira que é sua mão na minha, são as vozes que deixamos de ouvir. nessa ladainha de muitas curvas quem se perde sou eu.

rubens

os ventos que vem do mar, de mim não tomam conhecimento. perdendo quem quer das odisséias voltar, levando embora quem nunca partiu. com poucos escrúpulos, adentram nossas cidades, mudando os fluxos do dia, fazendo-nos ao abrir das janelas nos defrontarmos com as manhãs cinzas, brancas, e mesmo azuis, conforme os seus caprichos.

os ventos não favorecem ninguém, não se importam se já amanheci triste. pois se postam cinzas como memórias, e então chovem quando não há mais nada a fazer. há , porém, em dias como esses - arrogantes, malditos - outros meios pelos quais o sol, de mim, se aproxima - contrariando a vontade daquele que desconheçe meu nome. então, apesar da chuva, posso tocar o limiar virulento da vida. dias esses em que posso, além de todos os pré-nomes dados sem perdão, apenas sentar-me dentro de outros olhos e me reconhecer viva. lado a lado com um raro sujeito, sem grau algum de miopía na alma vasta.

meninas

a princípio é uma barreira impenetrável, quando sento ao seu lado e você não sabe meu nome. mas eu sei que é um caminho possível, é tentar ir com calma e pés cuidadosos. o mais importante é manter um fluxo caudaloso de atenção, você precisa saber que está segura, e te amparo como se te desse o braço. conduzo uma intermitência sutil entre meus olhos querendo comer sua alma, e meus olhos rondando o bar - pois eu sei que gosta de um tom blasê -. eventualmente cito cineastas, ou demonstro minha sensibilidade destrinchando os comportamentos ao redor. sei que ao final de duas ou três cervejas não serás minha, não serás minha nunca, e me alegro então.

quero sambar meu bem

Você que tem as mãos claras, as mãos limpas.
Pousa tua mão, na minha cara.
Deixa eu por os braços na sua volta.
Esquece todas as palavras do mundo,
por um instante,
esquece tudo.
Deixa eu te dar mais um beijo, pequena.
Esquece seus dramas, suas dores, seus discos.
Deixa eu te fazer um samba,
Na minha alma eu tenho tanto samba pra você.

espelho

osilêncio da multidão

por todas pequenas de milhares insignificantes janelas
- não interessa a ninguém.
pois ontem foi pessoa
entre as quadro paredes de um claustro inventado.
e hoje era eu

por quem a falta chamava o nome
e os rios e os mares não sufocavam a ausência.