segunda-feira, fevereiro 28, 2011

estate

eu quero ver coisas belas.
flores, frutas,
noites maduras
ressurgindo do calor
através das suas mãos.

quinta-feira, fevereiro 24, 2011

vermelho

bundas e peitos
e rostos cardíacos.
cidades de terra
e corpos perdidos.
sobe a poeira rubra,
sob os carnavais da fumaça
o sopro da carne brinca em seus rostos.

mãos dúbias,
línguas molhadas
duras.
entre dedos mamilos
festas.

os meninos sabem cantar e dançar,
vestidos com sua cor animal
pseudônimo.
eles sobem nos varais e se equilibram entre aves negras.

trombetas tocam
cornetas.
o tempo urge como a terra.

os corpos e os espaços conspiram,
instante largo e vermelho.

quarta-feira, fevereiro 23, 2011

azul

deixa eu deitar aqui. deixa eu ver o céu se fechar. deixa vir
é noite ou chuva.
deixa a imensidão azul cair nos meus olhos,
e entender qualquer coisa ou quase nada.

A cada volta que ela dá
a barra do vestido da rainha vem me molhar.
ela dança longe longe
não vejo o baile,
mas escuto os tambores.
eu vejo é a fumaça
que acompanha tão bem
a embriaguez do fígado ou da alma.

o rosto moreno dela se esconde nos passos e véus,
se ela olhar demais nos seus olhos
gira gira e puxa muito
labirinto de se afogar na escuridão.

respira fundo,
aqui você é pequeno demais.
estica os pés.

Lá em cima o moço fecha os passos fazendo a corte,
seu terno branco, anoitecido
é negro e negra é a ferida.
os dois se chamam
cachaças e excessos,

segredos sussurados em ventos,
danças correntes de ar,
a noite elétrica profunda e azul.

perder o pé, o gole
deixa-los dois
e dormir aninhado em amplidão.


de manhã a luz é pouca com cuidado para não os acordar.
tudo é ressaca, preguiça.
na praia sozinho você se estica,
flores e garrafas vazias.


terça-feira, fevereiro 22, 2011

sol

dá medo, sim dá medo.
cheiro de escuro
placidez.
o gosto de sangue negro
por trás de todas as camadas de pele.
o cheiro de coagulo.
sim dá medo.
o gosto de poeira.
num dia meio morto,
num sábado meio morro,
o sol só me diz da sombra.

dá medo, sim dá medo.
o som das pessoas em casa
os vultos
quando é sábado e você está só.
o sol é forte e arrasta as sombras pela parede de casa.
mas não importa.
ainda dá medo,
sim, dá medo.

sexta-feira, fevereiro 18, 2011

mar

o absurdo. o absurdo.
talvez o absurdo possa vir salvar.
o corpo quer se embrenhar no cheiro precários das ervas.
é verde, úmido
e intimamente real,
daninhas ou não,
as ervas que não vejo nessa cidade.

escuto ao longe como uma respiração
o chamar rouco do mar.
os canais correndo
gostos salgados ou doces
se misturado na boca dos deltas.

por todos os poros invadem as naturezas precisas
cores azuis, verdes, amarelo quase cinza.
aqui nessa cidade sem mar, sem rio, sem quase nada,
a lua é cheia e a única vida sou eu e os outros.

barcelona

suas aulas de balé só para acertar o passo,
que leva aos lugares mais inusitados.
entre ruas planejadas (e outras nem tanto),
entre a praia, o bar, a praça.
O cinza do paralelepípedo, o ortogonal asfalto,
e as cores e (re)formas de Gaudi.

Tudo que é antigo nessa cidade se refaz em luz e cor num novo sopro.
La rambla lotada.
As ruas tortas da gracia.

Barcelona se dá,
a você e a mim, em palavras interessantes sobre qualquer coisa como o mar.

Barcelona ficando bêbada
e não reparando na sua blusa cada vez mais reveladora.

Barcelona que sorri virando o rosto,
mas que olha nos olhos como se ouvisse música.

Barcelona e seu charme estranho,
de meia calça e postura de gato, de óculos e perna aberta.

Barcelona que transa como se respirasse,
e que parte, cálida manhã,
deixando saudades.

quinta-feira, fevereiro 17, 2011

lisboa

A palheta cinza, branca, azul, dos retratos europeus eram anteriormente frutos idílicos de estados de espírito que nunca conheci. Quando cheguei em Lisboa, porém, conheci essa luz opaca e azul atravessando os prédios - tão antigos quanto as histórias - as árvores nuas, as praças, a fumaça de castanha.
Lisboa nessa época do ano é azul. E linda de morrer.
Como uma menina bem menina, tímida e pudica, a irmã menor dentre todas as filhas da europa.
Lisboa é como uma menina que não sabe que é bela, e que deixa que você se esbalde na sua inocência. Até que ela se torne vazia, e você, morto de tédio, vá embora para a próxima paisagem.
Lisboa é uma menina muito pálida e quebradiça, macia e quase gorda, que você receia que de tanta doçura adoeça ao anoitecer.
É uma cidade que te dá vontade de viver, e andar, e morder, e morar, até que você perceba que nada que você faça vai mudar sua natureza: eterna menina pálida, com seus olhos bem azuis mais velhos que o mar.