domingo, fevereiro 17, 2013

falésia infalível

sempre tão pouco real.
sempre esse gosto incessante,
esse cheiro de carniça,
esse sopro da mentira,
essa presença no canto da cômoda,
no canto do quarto.
sempre tão pouco real,
e eu tentando enxergar
com o fundo da minha cabeça
(intuição)
e o tudo nublado,
com um bafo seco e úmido
de lágrimas muito velhas.
sempre magnético,
e a loucura deliciosa e perigosa
de cair num poço muito escuro.
o prazer improvável do corpo resvalando no mofo,
das unhas tentando se ater ao barro
como se fosse chão duro e estável.
sempre tão duro,
sempre tão distante,
sempre auscultar um coração que pulsava em algum lugar
mas sempre em lugar nenhum.
jogar-se de cabeça na falésia
e sentir a secura, o degredo, o cheiro árido das carcaças.
sempre sentir e nunca saber.
sempre ir e nunca parar.
e agora desafogar
desse estágio primário de insensatez.
olhar essa falésia,
e tantas outras.
olhar minhas mãos teimosas cheias de cacos.
o meu olho viciado em perigo.
e olhar o prado.
e um dia ainda querer o prado.
e não se importar com nada
e seguir.
como quem tem mãos e olhos e boca e cabeça e sentir e pressentir.
seguir como quem ao sair do nevoeiro disperso se olha e se reconhece.

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