sexta-feira, julho 20, 2012

braz

cava vorazmente com os dentes presos num pano. aprisiona entre os dedos, ou está aprisionado. entre a areia e a infinita função. desmama com raiva os grãos melancólicos de terra. transforma-os em areia. da sua barba braz nascem os fios delicados de água salgada densa. chuva, quiçá lágrima. cava há tanto tempo. sua unha manchada de ocre se mistura com o sabor ácido da terra. suas rugas recolhem as gotas de chuva, as organiza para que percorram a lateral do seu rosto. cava profundamente. e quando se esgota sente o tempo passando, inefável sob seus pés, como um vagão de metrô, que passa, passa, sempre vazio. talvez seja por amor que suas mãos penetrem eternamente na terra. talvez um eros ancestral. tão velho que é puro esquecimento, pura sabedoria. cava sem saber por que, sem saber por quem. cava como uma criança que insiste castelos de areia. cava sem duvidar do mar. da ferocidade do mar. da sinceridade do mar. sua devoção é patética. suas mãos estão sujas. todos riem. riem dele. ele já não se lembra. não sabe dizer não.não sabe duvidar. ele já não se lembra. ele recorda apenas. todos riem dele. ele chora. e nem sabe por que, por quem.

Nenhum comentário: