sábado, dezembro 22, 2007

equívoco

e no início a noite não passava do constante esforço de manter-se em pé, com os olhos lúcidos, e um sorriso no rosto. pediam-me como oculta vontade o humor, e eu despejava sob suas cabeças uma porção de histórias absurdas, embora factuais, para que pudessem transferir o diário desgosto da vida para episódios pouco eloquentes (já que ainda não lhes contara o segredo da insone amargura do café amargo).
nenhuma bebida, nenhum cigarro, nenhum carinho oculto por trás das esquinas. então entendia que a noite deveria ser encarada de frente, sem medo. para tanto, deram-me o riso como única defesa, e para quando não aguentasse mais, o ombro dos mais amigos para que pudesse enconder o rosto. porém, deveria acima de tudo persistir nos impulsos, e acreditar que dormir é sempre a última saída.

eis que a vida transborda das beiradas mal comedidas da vida, e que em ambiente tão infecundo, nasce um sentimento sem nome, travestido nos últimos dias pelo nome da saudade. enche-me o peito vazio desse denso emudecer, e mesmo que o saiba o nome de erro, é impossível esvazia-lo pelo tempo.
na noite proclamada, procuro as saudades, que recusa-me os olhos. e então é a primeira vez que me toca o peito algo que não via a tempos. toca-me e repousa as mãos, os dedos delicados, como o tecido da morte, por cima das veias saltadas e mal contidas. é a primeira vez na noite, e cansa-me tanto o sorriso, que nem sequer previno o ato.
pois o tempo segue sem medo, e sem medo também o inesperado ocorre. continuo a falar como se por trás do laconismo viesse a morte. sinto-me nua perante o bar que gira em voltas absortas dentro de um pensamento, e volto a me vestir, desesperadamente, com as palavras que não cesso de vomitar sobre outros ouvidos. os pressinto com o fundo de mim, e sinto infinito o negro gotejar percorrendo o meu corpo.
passam instantes. sempre instantes e as máscaras caiem. o cansaço invade a têmpora, caio de joelhos perante todo e qualquer esforço. o sorriso transforma-se em mudez, e a dor em consolo.
a mão, que antes delicada, amparava o músculo cardíaco no escuro do dentro, passa a asperamente o contorcer, como se o sangue fosse suco possível de infeliz resignação. o coração freme a cada aperto de mãos fortes, e sem resistência, cede à tristeza e seu estandarte.
o nada, antes previsto, devolve à palavra o poder do dizer mal, ou bem. maldição consumida em verbo, a lua amarela postada no ar que dizia aos incautos - mais cuidado. e bem a lua que da dor sabe, repetindo o não adiantar do cuidado, da precaução, ou dos pés calmos. pois quando o passo é largo, olha-se para o céu, e eis-se deslocado, novamente, na solidão de um erro.

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